domingo, 17 de outubro de 2010

A ciência que não chegou ao público

Mão direita de um rapaz que sofre de tuberculose óssea - fotografia publicada n'O Século
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Os últimos 150 anos foram marcados por importantes descobertas científicas que mudaram paradigmas e o dia-a-dia da sociedade em que vivemos.

Contrastando com essa mudança, pode afirmar-se que, de um modo geral, a imprensa jornalística portuguesa sempre tratou com indiferença ou desinteresse expresso na falta de rigor, o avanço da ciência produzida quer aquém, quer além fronteiras, assim como dos cientistas que a protagonizaram.

Exemplo disso é o silêncio jornalístico ao redor da visita de Einstein a Lisboa, a 11 de Março de 1915: nem uma única linha foi escrita pela imprensa portuguesa, e só sabemos dela através de notas do seu diário.

À procura de eventuais e raríssimas excepções, encontra-se uma e logo muito interessante, que está documentada no
Museu da Ciência da Universidade de Coimbra e que é contextualizada no livro “Breve história da Ciência em Portugal”, de Carlos Fiolhais e Décio Martins, publicado este ano pela Imprensa da Universidade de Coimbra e pela Gradiva.

*Comunicador de ciência e Investigador do Centro de Física Computacional da Uniniversidade de Coimbra

Na primeira página do jornal O Século de 1 de Março de 1896, foi publicado um artigo extenso sob o título “A Photographia atravez dos corpos opacos” (reproduzida num artigo de Décio Martins na página do Instituto Camões ). Nele, noticiavam-se os resultados da aplicação médica de raios X, obtidos pela primeira vez em Portugal e na Universidade de Coimbra, em Fevereiro de 1896, pelo Físico Henrique Teixeira Bastos.

Esta notícia e o seu conteúdo são espantosos pelo facto de os raios X só terem sido descobertos por Röentgen, três meses antes, a 8 de Novembro de 1895, em Wurtzburgo, na Baviera Alemã.

Isto significa que Teixeira Bastos e seus pares estavam em contacto atento e na vanguarda do conhecimento sobre a estrutura da matéria e das radiações electromagnéticas, mas também que existiam, no então Gabinete de Física Experimental da Universidade de Coimbra, as condições laboratoriais necessárias para a reprodução e validação experimental das descobertas científicas.

Sabe-se que esta actualidade científica deve muito aos contactos e viagens internacionais mantidas pelo Físico António dos Santos Viegas, também professor em Coimbra durante ,ais de 50 anos.

A notícia no O Século implica ainda existir então uma profícua colaboração interdisciplinar entre a Faculdade de Filosofia (que então albergava as ciências como a Física) e a Faculdade de Medicina.

De facto, essa relação de partilha de conhecimento resultou numa rápida aplicação médica das descobertas sobre a estrutura atómica que, neste caso, foi materializada com a criação em 1901, curiosamente o ano em que Röentgen recebe o prémio Nobel da Física, do Gabinete de Radioscopia e Radiografia no Hospital da Universidade de Coimbra.

Alguns dos instrumentos utilizados nas experiências então noticiadas, podem ser “visitados” na exposição permanente do Museu da Ciência da Universidade de Coimbra e no seu recentemente reaberto Gabinete de Física do séc. XVIII.

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